Contra o Consenso: Dinheiro estatal
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mercredi, février 02, 2005

 

Dinheiro estatal

Alguém em sã consciência reclama que se use dinheiro estatal para ajudar a custear uma Olímpiadas ou um algum evento desportivo do gênero? Obviamente não, uma vez que eventos como esse costumam gerar uma boa grana para os hotéis, restaurantes e outros serviços da cidade. Isso explica o patrocínio da prefeitura paulistana à parada gay, por exemplo.

Anos atrás, o então governador Mário Covas não permitiu que as quadras da USP ou parques públicos fossem utilizadas para sediar o Masters do tênis, um dos principais eventos do Esporte, dizendo que era lugar público ou sei lá o quê. Eu que custeio a "pública" USP com dez porcento do meu ICMS toda vez que vou ao supermercado não pude ver os melhores astros do meu esporte favorito. E a rede hoteleira de São Paulo perdeu uma boa grana(Isso sem contar a imagem), ao passo que bem, Las Vegas, que acabou sediando o evento naquele ano ganhou ainda mais diárias de hotel.

Por isso, deixem que o Estado ajude a custear o Fórum Social Mundial. É dinheiro que entra para o Estado do Rio Grande do Sul, é dólar entrando no Brasil. Claro, isso não decide porra alguma, mas deixem o pessoal do Fórum trepar, acampar e gastar dinheiro em paz.

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Quem conhece sabe bem que a esquerda brasileira tem muito grito, muito berro, mas pouca ação prática. Não é aquele monstro que move o mundo às escondidas. Lembro-me bem que na faculdade toda vez que eu organiza abaixo-assinado pedindo mudanças nas aulas, mudanças nos professores e outras coisas do gênero a turma que mais tinha discurso de "Chê, Fora FHC, Viva o MST" era aquela que mais fazia biquinho na hora de assinar. Era a mesma turminha que faltava e ficava namorando nos protestos contra a reitoria(Pô, os professores nem davam aula nesses protestos), era a mesma turminha que fugia e ficava quieta na hora de reclamar pessoalmente com o coordenador. Uma colega minha foi execrada porque a classe inteira ficou quietinha numa reunião.

Quem quer ação prática de protesto faz como a Oxfam, o Greenpeace, a WWF, os Médicos sem Fronteiras, o Exército de Salvação, Anistia Internacional, a Cruz(E Crescente) Vermelha, a Eletronic Intifada, entre vários outros. Assume um objetivo definido(Alguma empresa ou ação em específico), vão aonde as pessoas estão, se arriscam a serem presas ou a tomarem cassetada da polícia, ou ainda cedem tempo ou dinheiro fazendo trabalho humanitário aonde é de fato necessário. Não é vestindo a camisa de um sujeito autoritário como Che Guevara, batendo papo-furado no bar que vão chegar a algum lugar. A simples promoção de uma campanha para que as pessoas trocassem o Nescafé por qualquer outra marca de café solúvel poderia fazer horrores para que a Nestlé alterasse sua política de incentivar a troca do uso do leite materno por leite em pó, que é feita em países como o Paquistão e a Índia e que mata milhares de crianças. Usar o mercado- ao invés de falar mal dele.

Mas ir ao Fórum é mais fácil, não é?

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Os libertários americanos costumam dizer que caridade, assim como a liberdade, começam em casa. Eis aí a grande diferença entre a grande parte da direita brasileira e grande parte da esquerda brasileira: a direita brasileira quer que o estado pratique liberalismo, mas é incapaz de adotar uma postura liberal no tocante ao dia a dia. Não conheço liberais que doaram dinheiro para a USP ou outra universidade que tenham cursado e a maioria é incapaz de respeitar a opinião alheia, um dos preceitos básicos do liberalismo.

Parte considerável da esquerda brasileira não sai de casa sem carro(E vai mandando grana para a Shell, Ford, GM e outras multinacionais adoráveis), fuma como uma chaminé, não faz trabalhos de caridade nem doa dinheiro à instituições(A maioria nem chegou perto de uma favela), mas exige que o governo ajude os pobres.