Contra o Consenso: Felipe IV, o esquerdista
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dimanche, mai 22, 2005

 

Felipe IV, o esquerdista


A dita direita brasileira têm insistido na tese de que Hitler e Mussolini seriam de esquerda. Eu acho essa divisão entre esquerda e direita uma coisa besta, mas francamente, acho que historicamente os argumentos a favor deste argumento são tão bestas que nem mereceriam ser discutidos.

As bases do argumento são uma mera questão de semântica: "nacional-socialista"(Como se a própria palavra "nacional" não fosse contra o internacionalismo do comunismo da época e de que Hitler tivesse várias vezes reclamado várias vezes de que os marxistas tinham roubado o significado da palavra "socialismo" ou ainda trechos de discursos voltados aos trabalhadores ou coisas do gênero. Obviamente, por aí concluímos que Paulo Maluf é de esquerda, uma vez que sua principal obra viária, quando inaugurada, era conhecida como Rodovia dos Trabalhadores. O Partido Popular do José Maria Aznar seria de esquerda? E George Walker Bush, com seu "No Child Left Behind"?

Em termos práticos, não há grande diferenças entre regimes totalitários, de modo que querer ficar fazendo comparações entre Cuba ou entre o Chile de Pinochet sejam coisas como comparar tortura com eletrochoque ou por espancamento.

Há a fantasia entre a auto-intitulada direita que governos de direita são governos aonde o Estado é menor. Bobagem. Felipe IV, rei da Espanha nos tempos de Velásquez. seria um governante de esquerda? Afinal, o Estado e a burocracia na Espanha e nas suas colônias atingiam proporções assustadoras, as grandes propriedades eram dos amigos do rei(Aliás, a rápida queda da Espanha apartir de então, que se tornaria um país paupérrimo, e a rápida ascensão da Holanda e Inglaterra como maiores potências comerciais da Europa talvez seja a defesa mais contundente do liberalismo econômico). O Estado não permitia também que os individuos escolhessem sua religião, forçando muçulmanos, judeus e ateus a se converterem à força ou serem processados pela Santa Inquisição. Aliás, a maioria dos países de tradição católica, com exceção talvez da Polônia, Irlanda e alguns gatos pingados seja de ter uma burocracia e uma participação estatal na economia em doses cavalares. A mesma Igreja Católica adorada pela direita nacional.

Melhor ainda, seria o nosso regime militar de esquerda? Afinal, nos tempos dos militares a participação do Estado na economia e na vida dos cidadãos era muito maior. Os militares do Mobral, do Pró-Alcool, das barreiras comerciais, dos computadores Cobra, de um monte de obras estatais carissímas.

Uma simples olhada por textos neo-nazistas na internet já nos dá uma boa resposta. Não há nada que se possa ser relacionado com a esquerda. Atacam-se homossexuais, exaltam-se valores morais e familiares, o Exército. Esteticamente, Hitler seria o mais conservador possível. Ele perseguiria todos os artistas modernos da Alemanha, exaltando uma estética clássica, inspirada nos gregos e romanos. Ele patrocinaria Arno Breker, um escultor que seguia a mesma linha de nus inspirada nos gregos, romanos e renascentistas. Leni Riefenstahl, a cineasta do Reich, tinha uma estética clássica também. Suas bases de apoio sempre foram as classes altas da sociedade, como empresários(que usavam mão de obra dos Campos de Concentração) ou mesmo os advogados e outros profissionais liberais que formariam a SS. Não é algo que eu relacionaria à esquerda. Além do quê, uma das mais sangrentas guerras de toda a humanidade foi justamente a luta de Hitler com Stálin, e um dos pretextos utilizados para se perseguir os judeus seria sua relação com o socialismo, com listas de pessoas judias ou de ascendência judaica que seriam grandes nomes comunistas.

Claro, isso não quer dizer muita coisa. Stálin não tem muita coisa ver com a esquerda que governa a Finlândia da Nokia, e bem, Churchill e De Gaulle eram definitivamente políticos conservadores. Mas querer transformar Hitler em comunista, esquerdista ou qualquer coisa que o valha é algo que foge do senso comum.

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Vale lembrar que Olavo de Carvalho, o grande propagador da teoria do "nazismo de esquerda" já defendou Ezra Pond e Martin Heidegger, respectivamente defensores do facismo e do nazismo, como grandes nomes do pensamento da "direita".

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Os grandes riscos à liberdade não são nenhuma ideologia, que por mais estúpidas que sejam são um direito individual, mas sim o momento em que as pessoas aceitam aumentar o poder do Estado, excessivamente, em nome de um pretexto qualquer. Sim, como o combate ao terrorismo ou em nome da distribuição de renda.